O medo de amadurecer: por que tanta gente luta contra o Uber
Mariana Diniz Lion | 12 de fevereiro, 2016
Foto por Rovena Rosa/Agência Brasil
Era uma tarde quente de verão. 1993, São Paulo, Brasil.
Milhares de carteiros se reúnem em Assembleia, e neste momento a multidão brada, furiosa, palavras de ordem e revolta.
No meio da balbúrdia, o líder se ergue do povo, sobe no palanque e inicia acalorado discurso:
“Isso é um absurdo! Vai ter morte!!” – a multidão exulta em clamores, enquanto o chefe limpa gotas de suor da testa – “Essa tal de BBS acabou de lançar contas que enviam mensagens virtuais gratuitas para todas as pessoas, através dos computadores! Isso significa que milhares de brasileiros irão se corresponder eletronicamente a partir de hoje e nós perderemos os empregos! Seremos desvalorizados, depois de tanto trabalho duro, séculos de tradição e de oferecermos o suor de nossos corpos… esses burgueses capitalistas querem piratear nosso trabalho, através dessa tal Internet! Os carteiros estão revoltados, estou sendo abordado por diversos grupos pedindo a probição desse sistema novo, ilegal e usurpador! O Governo deveria tomar providências, porque se não tomar, eu não tenho como conter esta categoria! Vai ter morte! E digo mais, ao senhor Paulo Cesar Breim, que criou esse sistema de mensagem eletrônica gratuita – se houver morte, a responsabilidade é do senhor, que está aí ocupado em Las Vegas tomando champanhe!”
Para você, caro leitor, cujos olhos fitam incessantemente uma tela brilhante ao ler o texto acima que rebusquei com todo o meu carinho literário, o conteúdo do texto pode parecer – e é – uma aberração.
Nós todos sabemos que os Correios continuam lá, firmes, fortes e governamentalmente impassíveis. Enquanto a internet prosperou, bilhões de e-mails são trocados por dia – assim como Whatsapps, SMS, skypes, hangouts, team speakers para os afoitos jogadores online… Enfim, a tecnologia da comunicação se desenvolveu exponencialmente e apesar de sabermos que existem ainda centenas de possibilidades tecnológicas não-exploradas para esta área, compreendemos que há espaço para todos.
Os Correios ainda vivem, viva!
Apesar da licença poética com que expus a ficção acima, o grotesco discurso da liderança dos carteiros não foi inventado. Foi, digamos assim, uma releitura de um discurso já proferido a um veículo de comunicação. Foi uma reação de Raimundo dos Santos – a.k.a. Ceará – presidente do sindicato dos taxistas. O tema em debate? O polêmico Uber.
O aplicativo funciona como uma central de atendimento que une um indivíduo que quer se locomover a um motorista registrado e avaliado, que segue alguns parâmetros estipulados pela empresa. É como uma carona paga, um motorista particular express. E não – não é igualzinho a um táxi.
Os motoristas parceiros do Uber não ficam procurando passageiros pelas ruas ou aguardando nos pontos – são acionados pelo celular, através do aplicativo no qual o cliente deve se cadastrar, e pagos com cartão de crédito inscrito na plataforma (opção que, por si só, já deixa os taxistas que só recebem em dinheiro no chi-ne-lo).
O argumento central é que os taxistas são obrigados a pagar taxas e impostos altos, registros, licenças, passar por uma série de adequações para funcionar, enquanto os motoristas Uber não fazem nada disso e estão ganhando clientela. Agora eu pergunto: se O GOVERNO cobra dos taxistas valores exorbitantes para operar, através de tabelas fixadas PELO GOVERNO que repassam todas estas tarifas para o consumidor do serviço, enquanto O GOVERNO impõe uma série de parâmetros que dificultam e burocratizam a operação dos taxistas, então…
Por que estamos brigando contra o Uber e não contra a abusividade do Governo?
Simples! Porque o Uber funciona – e funciona bem.
E isso faz com que os taxistas sintam medo, porque seriam obrigados a aprimorar seus serviços e se virar nos 30 para oferecer mais vantagens, mais qualidade e preços menores ou formas de pagamento mais práticas para manter a estabilidade. No Uber, você combina um preço, contrata um motorista de carro de luxo que oferece a corrida pelo preço que você topa pagar (de acordo com os níveis de qualidade do automóvel), senta-se confortavelmente no banco de trás e atualiza sua rede social favorita usando o Wi-Fi enquanto é contemplado pela brisa fresca do ar condicionado e toma uma água. E você nem precisa correr riscos andando com dinheiro vivo na carteira – basta ter um celular com o app instalado.
E sabe por que esse serviço incrível é possível? Porque não há Governo cobrando tarifas abusivas, encarecendo o serviço e reduzindo a qualidade.
A questão é que a ausência de regulamentação governamental beneficia a todos – com a popularização do Uber, muito mais pessoas estão tendo acesso ao transporte individualizado.
Todos nós concordamos que é verdadeiramente absurdo o processo de burocratização pela qual os taxistas devem passar para poder exercer a profissão – e, provavelmente, quem apoia o Uber hoje se colocará ao lado da categoria de taxistas para defender a redução de regulamentação, quando finalmente decidirem levantar esta bandeira. Mas preservar a possibilidade de existência do Uber é preservar a liberdade de contratarmos o serviço que julgarmos mais interessante para nós. É ver na prática o poder da liberdade de concorrência.
Milhares de pessoas passarão a usar Uber – outras milhares continuarão usando táxis. Muitos motoristas migrarão para a plataforma – muitos permanecerão desenvolvendo a atividade através de seus veículos ou frotas. E haverá espaço para todos. Assim como os Correios e os servidores de e-mail coexistem pacificamente, após o período de adaptação às mudanças e amadurecimento da nova perspectiva, os taxistas regulados pelo governo e os motoristas parceiros do Uber também coexistirão e, (se os taxistas forem espertos) em paz.
A discussão pode se tornar mais complexa daqui pra frente, mas uma coisa é certa: ao longo da história, podemos comprovar que a tecnologia e o desenvolvimento venceram diante de modelos retrógrados e engessados. Estruturas tradicionais foram obrigadas a se reinventar para comportar as novidades ou, ao menos, equiparar-se à elas.
O avanço é uma grande oferta de conforto que alcança cada vez mais pessoas.
Por hora, a balança pende desigual.
Mas com a certeza de que nada pode permanecer estagnado e que tudo se renova periodicamente, tenho certeza de que quando menos esperarmos seremos testemunhas, tanto aqui quanto ao redor do mundo, da decisão cabal que irá reforçar os princípios de liberdade individual.
A “fumaça branca” da economia livre: Habemus Uber!
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Este artigo não necessariamente representa a opinião do Students For Liberty Brasil (SFLB). O SFLB tem o compromisso de ampliar as discussões sobre a liberdade, representando uma miríade de opiniões. Se você é um estudante interessado em apresentar sua perspectiva neste blog, envie um email para [email protected].