Por Rafael Campos | 26/03/2020
As consequências da crise gerada pela pandemia do novo Coronavírus não se limitam ao âmbito do sistema de saúde pública, mas se estendem a todos os setores da economia.
Em tempos de possibilidade de colapso econômico e de ações ineficientes do Estado no enfrentamento da crise sanitária e econômica, algumas perguntas vêm à tona: o que os liberais podem fazer para ajudar a minimizar os impactos gerados pela crise? O que o liberalismo tem a oferecer às pessoas durante períodos de catástrofe como os que estamos prestes a passar?
Para responder tais perguntas, é preciso retomar aos princípios básicos do liberalismo, principalmente os princípios da individualidade, da solidariedade e do voluntarismo. A liberdade, sendo um valor em si, não deve ser deixada de lado em períodos caóticos nos quais se faz necessária a ação individual e a troca voluntária de produtos e serviços.
A evolução da humanidade sempre se deu através da interação de indivíduos livres, capazes de se associarem e de inovar fazendo com que as sociedades verdadeiramente livres e prósperas alcançassem seu bem-estar graças à ordem espontânea advinda de inúmeras interações humanas que beneficiaram os indivíduos em vez de entes estatais.
Frente a isso, cabe a nós, indivíduos, decidirmos se esperaremos por uma solução milagrosa do Estado ou se chamaremos para nós a responsabilidade sobre a vida e subsistência nossa e de nossas famílias.
Ações que a princípio para alguns podem parecer pequenas, sem sentido, ineficazes ou mesmo desesperadas, podem fazer um grande bem individual e se aplicadas em larga escala, possuem potencial de fazer um grande bem social. Fato é que ações benéficas, mesmo quando não alcançam um grande resultado positivo, nunca causam nenhum tipo de resultado negativo. Então porque não tentar?
A partir dela conclui-se que quanto maior for a oferta de um produto em relação à demanda, mais baixo será seu preço e que quanto menor for a oferta deste produto em relação à demanda, mais caro ele custará. E isso se aplica diretamente sobre todos os produtos, principalmente sobre os alimentos que são tão importantes para a subsistência da população como ocorreu a exemplo do preço do tomate em 2013.
Deste modo concluímos que para que não haja falta de alimentos nem uma explosão nos preços dos mesmos (que afeta diretamente e de forma mais agressiva as camadas mais pobres da população), devemos aumentar a oferta deles. E fazer isso pode ser mais fácil do que se imagina, principalmente durante uma quarentena.
Como ajudar na situação econômica e alimentar das famílias? Pensando em uma cidade de médio porte, como Florianópolis por exemplo (477.798 habitantes), o cultivo de hortas residenciais a partir de vegetais de rápida produção como:
Esse tipo de cultivo pode ajudar muito com que as famílias mantenham o valor nutricional de sua alimentação mesmo em tempos de crise.
Além de poder ser usado como uma fonte de renda para aquelas famílias que venham a ser afetadas em decorrência dos impactos econômicos causados pela pandemia. A couve, por exemplo, é fonte de minerais do complexo B como a niacina (vitamina B-3), ácido pantotênico (vitamina B-5), piridoxina (vitamina B-6) e riboflavina.
As folhas e caules são boas fontes de minerais como ferro (sendo uma importante aliada contra a anemia), fósforo, cálcio, cobre, manganês, selênio, potássio e zinco. É também fonte de vitamina E e proteína.
Existem várias formas de se cultivar hortas em casa a depender do espaço disponível e clima do lugar.
As pessoas podem optar por vegetais menores como rúcula, espinafre, cebolinha e manjericão; por trepadeiras como o feijão vagem trepador e tomate carolina ou por olerícolas que podem ser plantadas em vasos, baldes ou garrafas como couve, jiló, alface, quiabo, etc. Tais práticas, se adotadas por apenas uma pessoa, a ajudariam a se manter e melhorar sua alimentação com ou sem crise alimentícia.
Mas se adotada por um número mais expressivo de pessoas, pode causar um verdadeiro alívio não apenas em suas vidas, mas nas de várias pessoas. É nessa hora que a iniciativa individual pode fazer toda a diferença no mercado e na sociedade, pois quanto maior for o número de pessoas produzindo seus alimentos em casa menor será a procura por estes alimentos nos mercados e por consequência, menor será a elevação de preços em função da crise que estamos enfrentando e que tem tudo para se agravar.
Além do aspecto mercadológico de oferta vs demanda, podemos também levar em consideração o fator solidariedade espontânea (ou caridade).
Por mais que não seja algo presente na totalidade dos indivíduos, este ainda é um valor que move vários deles e do qual muitos não abrem mão. Tal princípio, defendido por liberais uma vez que em uma sociedade livre, o grau de responsabilidade individual tem de ser elevado pelo simples fato de que o corolário da liberdade é a responsabilidade (quando existe liberdade sem responsabilidade, há apenas degeneração e indisciplina), deve mais do que nunca ser incentivado para amenizar os impactos do que está por vir.
Se uma pessoa que produz determinada coisa em sua casa acaba produzindo mais do que consumirá e não pretende vender o excedente, doá-lo a alguém que não possui condições de comprar ou de produzir pode ser uma das estratégias mais eficazes para o combate de um caos generalizado como o que já está sendo alardeado por muitos. Através da doação de alimentos ou de mudas para que as pessoas possam produzir em suas casas, reduzimos o efeito do aumento de demanda nos mercados sem deixar de consumir e sem fazer com que outras pessoas deixem de consumir.
Existem várias ferramentas disponíveis para o auxílio a quem pretende iniciar uma produção domiciliar de alimentos. Um deles é o “Horta Fácil”, software para o planejamento, dimensionamento e gerenciamento de hortas em geral, desenvolvido pela UFLA e pela UFSJ.
Nele é possível verificar informações de espaçamento, produção e ciclo de inúmeras culturas. Voltando ao exemplo da couve, a mesma pode chegar a produzir até de 50Kg de folhas por planta ao ano por metro quadrado de plantio. Tendo em média que uma porção de couve equivale a 40 gramas, um metro quadrado produz mais de cem porções de couve ao mês e isso já pode fazer uma grande diferença na vida de várias famílias tanto nutricional quanto economicamente.
Outro exemplo é o quiabo, que pode produzir de 15,0 a 22,0Kg por metro quadrado. Sendo assim, se 1% da população de Florianópolis aderir à iniciativa e plantar, por exemplo, um m² de couve, teríamos uma produção de 238 toneladas de couve ao ano ou 19,9 toneladas de couve por mês. O impacto que isso pode causar no mercado, na economia e na vida das pessoas é enorme.
Frente ao exposto, agora mais do que nunca é o momento de termos em mente o fato de que o mercado não se limita às lojas e empresas, mas engloba todos os indivíduos e suas relações voluntárias que possuem potencial tanto de agravar quanto de atenuar os efeitos da crise histórica pela qual estamos passando.
Trabalhar a responsabilidade individual, o desapego ao paternalismo estatal e ter iniciativa nunca se fez tão necessário (ao menos não na nossa geração) quanto agora. Não é responsabilidade nem competência do Estado resolver todos os problemas do mundo; e mesmo que fosse, a história já nos deu provas mais do que suficientes de que ele é incapaz de fazê-lo.
A liberdade não serve apenas para falarmos e fazermos o que bem entendermos, mas também para tomarmos as medidas necessárias para nosso desenvolvimento, subsistência e sobrevivência. A reação do mercado não significa apenas “a reação das empresas” como muitos pensam, mas a reação dos indivíduos que compõem o mercado (ou seja, todos nós) frente a momentos de crise. Iniciativa privada não se trata apenas de uma pessoa que abriu uma empresa e possui um CNPJ, é toda iniciativa tomada por indivíduos com o objetivo de solucionar um problema e atender uma demanda.
E por fim, caso o mercado de consumo não tenha uma reação rápida frente ao problema, ficaremos reféns do arbítrio dos burocratas e políticos que não se importam com nada além dos interesses seus e de seus aliados. Lembrando que, em sociedades livres, as pessoas têm de ter elas mesmas a responsabilidade de se precaverem e de se salvaguardarem.
São elas que têm de assumir sozinhas as consequências de suas decisões. Essa noção de que elas têm de se cuidar para o futuro (tão longe da realidade brasileira) as impulsiona a serem mais precavidas desde cedo. Incentiva, por exemplo, as pessoas a fazerem seguros de vida, a pouparem mais, fazer planos financeiros para suas aposentadorias, dentre outras medidas.
Ficar inerte frente a possibilidade de uma crise já anunciada é pedir para sofrer as consequências que poderão resultar deste momento e perder um tempo precioso no qual se pode agir.
Agir agora e tomar medidas de precaução não trará nenhum mal a ninguém, até porque o máximo que pode acontecer caso as pessoas comecem a produzir alimentos em casa em maior escala é a derrubada dos preços dos mesmos caso a crise não atinja patamares que afetem o abastecimento. Defender o liberalismo e a liberdade também significa defender a responsabilidade que cada um tem sobre sua própria vida, não apenas diminuição de impostos e privatização de empresas.
É a defesa de que cada um possa fazer o que for necessário para garantir seu bem-estar e das pessoas de que gosta, mas para isso é preciso que haja iniciativa individual. Não adianta defender a liberdade no pensamento e no discurso, quando as práticas adotadas são individualmente são socialistas. É hora de agir.
Este artigo não necessariamente representa a opinião do Students For Liberty Brasil (SFLB). O SFLB tem o compromisso de ampliar as discussões sobre a liberdade, representando uma miríade de opiniões. Se você é um estudante interessado em apresentar sua perspectiva neste blog, envie um email para [email protected] ou [email protected].